A entrevista que saiu pela culatra

Mensagens de repúdio ao recente filme ‘A Entrevista’ chegaram a Hollywood por meio de ações de hackers auto entitulados ‘Guardiães da Paz’. Como bons hackers, ninguém sabe quem são e a que vêm. O fato é que depois de alguns emails violados e algumas mensagens espalhando terror nos EUA, o filme acabou não estreiando. De um lado a  Sony Pictures é pressionada por hackers, aparentemente (mas não oficialmente) apoiados pela Coreia do Norte, que são contra a exibição do filme, e por outro lado, a mega produtora é pressionada pela opinião pública – leia-se majoriamente americanda e britânica – a favor da tal ‘liberdade de expressão’, alegando que o cinema não pode sucumbir a ameaças terroristas.

‘A Entrevista’ seria a fictícia história de como a CIA encarrega dois repórteres americanos a caminho da Coreia do Norte de assassinarem o seu líder político, Kim Jong Un, que para a população local, é tratado como um Deus, entidade absoluta caminhando sobre  terra.

Ora todo mundo sabe que a Coreia do Norte é o país mais isolado do globo. Que sua população é feita prisioneira há décadas, de uma tirania comunista, que tortura e pratica lavagem cerebral. Que é a ditadura mais cruel e lunática ainda vigente. As parcas notícias que chegam de lá, são apenas aquelas permitidas pela propaganda política local.

Sim, o mundo deve ficar atento e tentar as vias diplomáticas necessárias pela defesa dos direitos humanos daquele povo. Mas daí aos ‘libertadores’ norte-americanos escancaradamente criarem uma ficção tragicômica sobre a morte do todo poderoso norte-coreano, premeditada pela CIA, vai muito além do bom senso.

O burburinho de ‘A Entrevista’ que não saiu, não é caso de ‘liberdade de expressão’ contra o ‘terrorismo’ apenas, mas de geo-política internacional. Assim como o 11 de Setembro foi orquestrado como um espetáculo audio visual, nenhuma questão bélica hoje passa despercebida pela indústria do entretenimento. Como é que Hollywood não imaginou atos de coerção como resposta? É como mexer com a onça e achar que vai ficar tudo bem.

Penso que qualquer abordagem da Coreia do Norte, especialmente vinda dos EUA, é de extrema delicadeza. A Rússia e grande parte do Oriente Médio estão contra Obama… A Guerra Fria passou, mas não tem como não lembrar do nosso passado bi-polarizado. Parece que os americanos sentem saudades daquele tempo.

Não surpreende que os recentes hackers invocaram o 9/11, anunciando ataques ainda piores para estreia do polêmico filme, que estava programada para este Natal. As ameaças, reais ou fictícias, geraram diversas reações na comunidade americana. A maioria anda pregando a “liberdade contra o terrorismo”. George Clooney, revoltado, quer ver ‘A Entrevista’ ser lançada a qualquer custo. E hoje a mídia internacional amanheceu anunciando a retaliação do líder norte-coreano, que acostumado a unanimidades e obviamente ofendido, questiona o Washington pela obra de ficção. Enfim, quantas verdades e quantas mentiras são publicadas todos os dias? Leia de tudo, dúvide de tudo e forme a sua própria visão.

O filme, ainda que saia em dvd, depois de toda a polêmica, provavelmente não merecia essa discussão toda. Eu não estava interessada em ver mesmo. Só queria ressaltar a petulância americana, em brincar com uma situação tão séria. Como sempre fazendo o que querem da diplomacia internacional. Mais fascinante mesmo é descobrir que além de tudo a Coreia do Norte produz filmes e que seu atual grande líder ama o basquete americano através de um documentário da Vice magazine.

E leia mais: no Globo ou no The Guardian.

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Ludmila Rodrigues
Ludmila Rodrigues
Ludmila Rodrigues é carioca, artista plástica, cenógrafa e professora, radicada em Haia, nos Países Baixos. Seu trabalho une a dança à arquitetura, construindo pontes entre os cinco sentidos e a arte, entre a experiência individual e a coletiva. Ludmila também é apaixonada por kung fu e por cinema.

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