Schopenhauer e o Kung Fu

“vá ler um livro” - mantra de todas as pessoas que odeiam Big Brother Brasil

Nota da comunidade: Recomenda-se fechar essa crítica agora mesmo, sério! Mas caso tenha algum complexo de mártir ou especial apreço por um chute nos bagos, leia esse texto ao som de “Kung Fu Fighting” do inigualável Carl Douglas. Em época do ano que sempre surge o falso dilema “ver BBB ou ler um livro” recomendo fortemente um leve afogamento voluntário em uma praia lotada para contemplar, e sentir, nossa pequenez existencial. Deste modo, é muito provável que não volte a inventar embates fictícios sobre literatura e programas de televisão. Ou seja, menos lacre, mais látex.

Mas se você realmente prefere ler um livro, quem sabe essa resenha não tenha sido escrita pensando em sua gigantesca existência… Quem sabe? Sem mais introduções caóticas e despropositadas; o que o filósofo mais rabugento da história da humanidade tem a ver com uma milenar arte marcial chinesa?

Schopenhauer e o Kung Fu do Caléu Moraes. Sim, o autor que já havia surpreendido com “Guia literário para Machos” com um narrador cretino e misógino que parece ter saído de um conto do Bukowski ou de um congresso do MBL, e também com “Satíricon: Livro I”, que simula (ou não, há quem afirme se tratar do Santo Graal literário) de forma espetacular o clássico de Petrônio e apresenta um novo, empolgante e divertido capítulo na história de Encólpio e do jovem Gitão. Enfim, ou melhor, em meio, você por um acaso sabe o que é um Caquesseitão? Não é isso que você está pensado. E não, isso não é um teaser pouco inspirado de uma matéria do “Casseta e Planeta.” Eu falei de “látex”, mas me recuso a fazer piadas com seringueiros.

Calma seus puritanos, é apenas um animal mitológico, talvez real. Tão estranho que deixaria envergonhado o engenheiro axial que produziu o ornitorrinco, certamente. O Temido e Fofo Caquesseitão. Saca só nessa figura abaixo, ou ao lado, eu nunca sei qual é a desse editor, e sente o naipe do querido. Ah, e por qual razão estou ofertando tão bela criatura aos seus olhos? Apenas porque o tal caquesseitão está presente nesse romance, ora. Se por alguma razão que me foge a compreensão, se esse bichinho superlativo não foi suficiente para despertar sua curiosidade, talvez esses outros destaques consigam;

Um caquesseitão prateado

Sim, uma mistura de sarau poético e lupanário, uma face do empreendedorismo que finalmente consigo respeitar; um encontro com o sempre simpático Jackie Chan, que para fins de tradução cinematográfica é uma espécie de Renato Aragão chinês; a possível história do Haddouken, o famigerado golpe fatal reproduzido em milhares de fliperamas ao redor do Globo; a saga psicológica e fascinante por trás da busca de uma estatueta de um buda que ri e inúmeros outros episódios improváveis e deliciosos.

Em suas 154 páginas Caléu exibe com grande perícia um bordel literário. Ah, por óbvio que temos um capítulo sobre vampiros.  Essas figuras encantadoras que quando comedidas representam o que há de mais sustentável no planeta terra. Não é segredo, quem não gosta de vampiro, bom da cabeça não é. Exceto quem foi mordido e teve que tomar 57 vacinas antirrábicas na barriga, por óbvio.

Dentro da narrativa, o autor nos ensina as diferenças de como escrever uma história policial, o detetivesco e a novela negra. Explica as características do romance policial chinês, onde não importa muito quem é o criminoso, mas sim a investigação, tal qual o próprio rebento do autor, onde o título entrega os “criminosos”, mas não a jornada. As subtramas encantam pela premissa e não pelo resultado. E elas se confundem pela própria estrutura do livro. Esse caquesseitão literário. E há dentro de tudo isso, a história principal que é a do narrador, em especial o seu modo de encarar o luto. Sem a melancolia do Cristovão Tezza e a prolixidade do Karl Ove, mas com uma coreografia marcial etérea.

Capas dos livros O Filho Eterno de Cristovão Tezza, A Morte do Pai de Karl Ove e Schopenhauer e o Kung Fu de Caléu Moraes

Enfim, o que posso dizer é que o autor é um alquimista dos absurdos. Há uma ironia fina durante toda a história, mas o que mais impressiona é que mesmo diante de toda a insensatez, as improbabilidades, as extravagâncias dos episódios narrados, tudo parece verdade. Há um lastro de realidade. Se Caléu ganhasse dinheiro como teórico da conspiração estaria rico, porque sabe arquitetar as ideias, por mais improváveis que elas pareçam. Nossa sorte é que hoje ele provavelmente está algemado no porão da editora Nauta!

Avaliação: ⚡️⚡️⚡️⚡️⚡️

* * *

Capa do livro schopenhauer e kung fu.Título: Schopenhauer e o Kung Fu
Autor:  Caléu Moraes
Editora:  Nauta
Ano: 2023

Compre o livro do Caléu

Siga o TREVOUS ⚡️ nas redes sociais: InstagramTwitter e Facebook.
Artigo anterior
Próximo artigo
Rafael Sollberg
Rafael Sollberg
Rafael Gondim D`Halvor Sollberg tem nome de príncipe escandinavo, mas é plebeu latino-americano até a raiz dos ossos. Antinatural em qualquer lugar, embora nascido no Rio de Janeiro, é um sociopata com consciência social, ateu pouco convicto, escritor moderado e leitor radical. Integrante proscrito do Podcast “Esculachos Cacofônicos” e vídeo-resenhista de clássicos clandestinos da literatura nacional no Canal do Youtube: “Adorei! Nota 2.”.

DEIXE UMA RESPOSTA

Por favor digite seu comentário!
Por favor, digite seu nome aqui