Viaje de trem

O recente lançamento do Daft Punk trouxe de tabela, e mais uma vez, a nostalgia da Disco music – época que eles sempre reavivaram em seus álbuns. Dia desses alguém mixou a nova ‘Get Lucky‘ com imagens de um programa antigo da tv americana. Na telinha de ontem, ao som dos robôs franceses de hoje, dezenas de pessoas se requebram diante de uma câmera que desliza em linha reta, num desfile de dança e de calor humano. Era o Soul Train, palco da música negra dos anos 70, e de outros gêneros futuros, que pra nossa felicidade pode ser revisto em milhares de vídeos online.

O Soul Train foi ao ar pela primeira vez em 1971 e só saiu de cartaz em 2006. Isso mesmo, 35 anos de discoteca. É considerado o programa mais duradouro da história da televisão aberta, com mais de 1.1000 episódios. Marvin Gaye, Jackson 5, Diana Ross, todos estiveram lá, repetidas vezes. Além de testemunhar a evolução da música e da cultura pop, o telespectador pode se deliciar com a expressividade, a energia e também com a moda que vestia aquele povo cheio de graça. Movidos pelo som, pelas drogas ou por pura adrenalina, esses moços dão a impressão de que o mundo, pelo menos pela televisão, era muito mais feliz antigamente. Antes dos faustões, das xuxas, dos hucks e seus prováveis equivalentes americanos, o estúdio era tomado de Música, no mais verdadeiro sentido do termo. (Falando nisso, quantos anos a MTV durou mesmo? Praticamente hoje em dia “MTV” é apenas o nome de um canal como outro qualquer.)

Sempre em dupla, os dançarinos iam entrando em cena, exibindo seus dotes rítmicos e corporais, num clima de celebração total. Alinhados ao trilho do trem, os convivas aguardavam a vez, ovacionando os colegas ao centro. Os bailarinos eram ao mesmo tempo o próprio público, sem distinção de palco-plateia. Estavam ali os passinhos nascidos nas ruas de Chicago, sinais da break dance, e de tantos estilos que iriam influenciar as danças urbanas de hoje – inclusive o funk carioca. O apresentador-produtor Don Cornelius, sempre em cena, introduzia a festa televisionada, que ia ao ar toda semana, e trazia também artistas de peso. Convidados para cantar e conversar com o público, eles eram entrevistados abertamente por membros da plateia. Ainda que com os famosos convidados, as estrelas mesmo eram os participantes, dançarinos, homens e mulheres comuns, pés de valsa, como eu e você.

Siga o TREVOUS ⚡️ nas redes sociais: InstagramTwitter e Facebook.
Artigo anterior
Próximo artigo
Ludmila Rodrigues
Ludmila Rodrigues
Ludmila Rodrigues é carioca, artista plástica, cenógrafa e professora, radicada em Haia, nos Países Baixos. Seu trabalho une a dança à arquitetura, construindo pontes entre os cinco sentidos e a arte, entre a experiência individual e a coletiva. Ludmila também é apaixonada por kung fu e por cinema.

DEIXE UMA RESPOSTA

Por favor digite seu comentário!
Por favor, digite seu nome aqui