E quando não tem vida, a arte imita o quê?

Ilustradora convidada: Luiza Montezuma

Os mais desavisados podem até ter a impressão de que o caos que se alastrou pelo mundo nos últimos meses foi bom para quem trabalha com a escrita. “Menos paz na alma, mais inspiração”. Se esquecendo de que não vivem na época de Lord Byron, mas, sim, de La La Land.

A ideia de que os autores agora vão ficar mais tempo em casa também tende ao pensamento de que o apocalipse que vivemos é positivo para os criativos por aí. Mas, infelizmente, em terra de olho, quem tem cego. Errei.

Eu até acreditava no caos como uma ótima força motriz da criatividade, inclusive porque muitos dos meus textos foram catalisados por ele. Só que isso era antigamente: quando o caos era estímulo, não pavor. Inspiração momentânea, não status quo. Hoje esse desalinho é o próprio sistema, ou, como dizem os internautas, o “novo normal”.

Principalmente porque agora ninguém mais tem vida, apenas “lives”. Então, com caos, sem vida; e, sem vida, sem assunto. Aliás, na verdade, assunto é o que mais tem. As notícias não param de chegar. E olha que tinha muita gente dizendo que a coisa estava difícil era para os jornalistas.

Porém, se esquecem de que eles trabalham com fatos – e se tem uma coisa que está acontecendo esse ano são os fatos, fazem parte do caos (agora nomeado “dia a dia”). A cada 20 minutos tem alguma novidade, mais escandalizante que a de 20 minutos atrás. São várias jóias brutas só esperando para serem lapidadas pelas redações de todo globo.

Eu até podia tentar falar de algo político também. Por exemplo, a Flordelis, o caso dela mexe comigo. Falso moralismo é um assunto legal de falar. Mas também… Vamos ser sinceros… Já está todo mundo fazendo isso.

O Instagram, aplicativo onde os escritores têm passado 90% do tempo (assim como o resto da população), está cheio de debates sobre a deputada-pastora. Não tem muito como inovar. E tampouco acho que o mundo precisa de mais um comentarista online.

E até por isso acho que eu deveria ter sido contador, não contador de histórias. Contador de contabilidade mesmo. Porque, se parar para pensar, os contadores são os mais necessários hoje, o PIB caiu 10%. Está todo mundo desesperado.

E, como eu disse lá em cima, o desespero (filho primogênito do caos) também não é um cenário ideal para criar. Até pode ser para uns autores que gostam de sofrer, mas, com o já deu para perceber, eu sou mais do caô que do caos. Escrever em Pasárgada é melhor que no Palácio da Guanabara.

E, se você não entendeu essa última piada, sinto em lhe informar que você está perdendo a segunda melhor confusão-da-política-atual (depois da Flordelis-gate). Há duas semanas o governador do Rio foi afastado por corrupção. E seu vice iria substituí-lo. Mas o vice também foi afastado (pelo mesmo motivo). Então o presidente da Alerj iria assumir o governo do estado. Mas… Adivinhe… Ele também foi afastado. E pasme: pelo mesmo motivo. Aí eu te pergunto: tem como ser mais criativo que isso? House Of Cards até tentou, mas, assim como os governadores do Rio, também foi afastada. Vou ter que voltar para as lives.

* * *

Ilustradora convidada:

Luiza Montezuma

Cresceu desenhando e cresce ao desenhar. Estuda Relações Internacionais e a tensão do estudo da política é aliviada pela catarse das matizes e dos pincéis. Sempre criando sem buscar a perfeição, apenas com o intuito de ser curada!

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Gustavo Palmeira
Estudou em colégio de padres, era 90% sexy no Orkut, mas hoje infelizmente, alem de roteirista, se apega fácil a qualquer um que der moral no Tinder.

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