A Apple que matou Shakespeare

Ilustrador convidado: João Vieira

A tecnologia atual é uma coisa incrível. Através dela, a humanidade consegue explorar planetas nos quais jamais vai colocar o pé, espalhar fofocas para o outro lado do mundo em menos de um segundo e fazer análises das profundezas de oceanos que, se colocasse o pé, seria esmagada pela pressão. A comunicação foi encurtada de maneira inimaginável há 20 anos. Os celulares viraram praticamente um órgão avulso de cada indivíduo, sendo motivo inclusive de doença — já viu alguém com a tela quebrada? O bicho pega.

A Apple é a líder desse movimento de integração humano-mobile. Seus aparelhos vêm a cada ano mais sofisticados (e os antigos param no lixo cada vez mais rápido). No entanto, por mais avançado que o Iphone seja, parece que alguns defeitos são impossíveis de serem corrigidos pela empresa que é referência em inovação. Muda o tamanho, o processador, a qualidade da tela, da câmera, dos nudes, das fake news, mas todo mundo sabe que a bateria vai sempre continuar horrorosa. Já tive 3 Iphones e posso garantir que, mesmo que agora eles tenham câmera frontal, 4G, rastreador, asa, transfusão de sangue, cozinhar risoto de frutos de mare outros itens surpreendentes, a característica semelhante aos 3 que tive é a curtíssima bateria de todos eles.

Não sei se é por identificação com a marca, gostar do processador ou só seguir a moda mesmo, mas não mudo a marca dos meus celulares há mais de 4 anos e posso afirmar com toda certeza que, em apenas alguns meses, a bateria de todos eles viram mais viciadas que a Grazi Massafera naquela novela que ela fazia uma cracuda. E não adianta mandá-lo para reabilitação, quando você menos esperar, ele vai estar vendendo os móveis da sua casa e fugindo à noite para alguma boca de carga.

Meu maior problema com isso tudo é que sou viciado em celular. Aguento ficar sem um rim, mas não sem ele. Principalmente por ser escritor. Pois, como todos que já tentaram passar suas ideias para o papel (ou para o bloco de notas) sabem, a inspiração é tão rara quanto àquele cometa que só é visível da Terra uma vez a cada 84 anos. E eu devo ser como a Dory de Procurando Nemo e ter perda de memória recente. Se não escrevo a ideia naquela hora em que ela bateu em minha porta, a danada desaparece, vai embora sem dar tchau e tenho que esperar o próximo cometa passar.

Como todo bom escritor, não posso me dar ao luxo de ser “somente” isso. Preciso de um emprego “normal” que pague as contas. Então, quando a nossa amiga Inspiração aparece, nunca estou na frente do computador pensando sobre o que escrever. Estou no trabalho tentando conseguir a grana para sobreviver o próximo mês. A solução é fingir que vai ao banheiro, escrevê-la no celular e depois passar para o Word torcendo para que fique boa. Se o lindo do Iphone está sem bateria, bye bye texto.

Apple, você não vê quantos livros o mundo está perdendo por sua causa? Imagina o tanto de Shakespeares e Nerudas espalhados pelo globo que não vão poder escrever suas ideias no banheiro da firma porque a bateria acabou. Picasso disse que “a chegada da inspiração não depende de mim. A única coisa que posso fazer é garantir que ela me encontre trabalhando”. No meu caso, só espero que ela me encontre com mais de 20% de bateria.

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Ilustrador convidado:

João Vieira

Estudante de animação, ilustrador e futuro artista conceitual. Amante de séries, desenhos e livros. Trabalho (e vivo) ouvindo música, e desenhando sempre quando tem tempo. Entrando no mundo da pintura digital.

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Gustavo Palmeira
Gustavo Palmeira
Estudou em colégio de padres, era 90% sexy no Orkut, mas hoje infelizmente, alem de roteirista, se apega fácil a qualquer um que der moral no Tinder.

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