Quem Espera Sempre Cansa

Ilustradora convidada: Louise Coutinho

Já faziam meses que a população de Cortélia passava fome. A miséria e a seca se alastraram por todas as terras do reino e , num lapso de esperança para a população, os chefes das tribos cortelienses se organizaram e fizeram com que o rei prometesse um discurso sobre as melhorias que faria aos seus servos.

O pátio do castelo estava lotado. Todos os meros camponeses aguardavam o discurso de seu rei, que havia prometido fazê-lo do topo da torre-sem-fim, localizada em frente ao pátio, em apenas algumas horas. A multidão dançava, pulava e rastejava, mas as horas foram se passando e nada da realeza aparecer.

Foi quando os primeiros indivíduos se cansaram da espera, que surgiu da sacada do primeiro andar o bobo da corte oficial do rei. O profissional da comédia contou as melhores piadas já ouvidas por qualquer um que estivesse naquele lugar e narrou histórias de gigantes que impressionaram até os mais corajosos navegantes do local. Ele encantou a todos com seu espírito animado que irradiava daquela sacada.

Essas três dançarinas chocaram toda a plateia com seus movimentos maravilhosamente elaborados. Suas coreografias homenageavam cada uma das milhares de tribos que lá estavam. E a mair arma-nada-secreta delas eram suas lindas faces e silhuetas que faziam homens, mulheres e pessoas-objeto prestarem atenção em cada detalhe da deslumbrante performance.

Chovia e ensolarava, nevava e desertificava, a fome apertava e o sono batia, mas as três e os cem mil permaneciam na sacada e no pátio, respectivamente. Foram mais alguns meses ou anos até que elas encerraram suas danças. Contudo, a maior parte da multidão já nem se lembrava mais do porquê estava lá, apenas brincava de adivinhar a próxima atração que lhes seria oferecida.

Os poucos que perguntavam se o rei apareceria logo eram capturados pelos guardas espalhados no salão. Entretanto, os pensamentos desses descontentes duraram só os poucos momentos em que não haviam apresentações em alguma das várias sacadas da torre-sem-fim. Assim, foram logo dissipados, pois, após alguns minutos passados, saíram voando da sacada do terceiro andar vários dragões. Onde já se viu? Dragões domados! Era de levantar o ânimo até do mais cansado idoso que lá estava. As pessoas olhavam para os céus e, mesmo queimando seus rostos por causa do Sol, agradeciam a chance de presenciar cenas como aquela.

Os anos iam passando e das infinitas sacadas saiam bardos cantantes, alquimistas brilhantes, cavaleiros errantes e princesas com roupas indevidas, mas sempre a uma sacada acima da anterior para que assim a plateia olhasse cada vez mais alto e se esquecesse do chão de pedra fria em que pisava.

Essa espera dura até hoje, se você resolver passar no reino de Cortélia poderá ver desses maravilhosos espetáculos e uma multidão-sem-rosto que aguarda ansiosa e passivamente as palavras de sua majestade, mas não tente alertá-los de sua estupidez! Poderá acabar indo para a cadeia feita pelos vários oficiais do rei para garantir a segurança de todos.

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Ilustradora convidada:

Louise Coutinho

Tenho 23 anos, sou paulistana, formada em design de moda e atualmente estudo ilustração. Tenho muito interesse no retrato da vida cotidiana e das singularidades de cada indivíduo e para a minha prática procuro sempre desacelerar e observar o que poderia passar despercebido por olhos desatentos, e quem sabe, tornar o que é ordinário em algo interessante e bonito através das minhas ilustrações.

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Gustavo Palmeira
Gustavo Palmeira
Estudou em colégio de padres, era 90% sexy no Orkut, mas hoje infelizmente, alem de roteirista, se apega fácil a qualquer um que der moral no Tinder.

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